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Exercícios para a voz-Parte 1

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Mensagem por Admin Ter Dez 30, 2014 2:54 pm

Olá a todos, só irei postar exercicios para a voz, serão 4 partes.

Introdução                       

   O ator é o profissional que transmite ao outro a obra escrita. É, grosso modo, um co-autor,  pois consegue dar vida a personagens retirados de textos escritos. Assim, o texto imprimido, composto por um grande número de letras, vocábulos e frases,  transforma-se em um continuum sonoro, enriquecido por uma interpretação rica de nuanças, conteúdo emocional, veracidade, entre outras características. Para cada segmento sonoro ( parte deste continuum sonoro), temos uma palavra correspondente do texto escrito. Contudo, esta correspondência, de forma alguma, pode ser considerada equivalente. Isto se deve ao seguinte fato: o segmento sonoro é uma realidade física, sonora, e como tal, transmite um conjunto imensurável de informações vivas e quase sempre diferentes (ou muito diferentes) daquelas transmitidas por uma sucessão de letras da palavra impressa. Sendo assim, a realização concreta da palavra, a fala em si, oferece ao intérprete uma gama muito grande de escolhas significativas, tendo, como resultado, diferentes reações e impressões manifestadas pelo espectador. O ator é, portanto, o artista que “joga  e inventa”  com as palavras. Utiliza-se, para este fim, inflexões e acentos expressivos, diferentes ritmos, variadas velocidades de fala, uma articulação necessariamente clara, sem exageros,  e  uma elocução com  pronúncia teatral. No entanto, é preciso ressaltar  que todo esse fazer “cênico”, difere, naturalmente, de nossa comunicação cotidiana, estabelecendo claramente os limites entre a fala artística e a fala do dia-a-dia.
    Há, com base no que acabamos de expor, uma estreita relação/colaboração entre o escritor (dramaturgo, romancista, poeta ou cronista) e o ator. Por trás de cada gesto corporal e vocal, encontrar-se-á  a força de uma palavra (de um signo lingüístico), evidenciando, em maior ou menor grau, o valor da associação existente entre a criação do vocábulo e o gesto vocal. A escolha do gesto vocal está relacionada à força expressiva do texto, à forma como quer-se passar a mensagem. Não pode, de forma alguma, está atrelada a esquemas melódicos já conhecidos ou a soluções mais fáceis e distantes do conteúdo lingüístico do personagem. Caso isto ocorra, a construção do personagem certamente soará artificial e distante do espectador. Todos os sons realizados pelo ator no palco, isto é, os ruídos consonânticos e vocálicos, as matizes sonoras, decorrentes de distorções expressivas de articulação[1], o deslocamento da tônica da palavra e os diferentes tipos de pausas realizadas[2], são formas encontradas para expressar a mensagem que transcende muito as palavras impressas do texto. O teatro tem como função a reprodução de sentimentos e de situações, procurando despertar no espectador uma gama de sensações, crenças e reflexões. É uma arte viva, portanto! Entretanto, para que este fenômeno ocorra, o ator precisa tirar de sua voz o que ela tem de melhor (matizes, nuanças, voracidade, suavidade) como um verdadeiro instrumentista que manipula com virtuosidade e com agilidade o seu instrumento musical. É, assim, um instrumentista da voz! Expressaria melhor: é um compositor vocal! A descoberta e o domínio de todo esse potencial vocal, no entanto, exige a aprendizagem de uma técnica que ensine a utilizar a respiração, a voz, a articulação, a pontuação, a entoação, o ritmo e a velocidade de fala. A assimilação da técnica vocal para o teatro, permite, ainda, a liberação de recursos de expressão inerentes ao falante, como a expressão vocal-corporal, o temperamento, o conhecimento das possibilidades do corpo e da voz e um julgamento mais consciente quanto a construção vocal-corporal do personagem. Todos estes aspectos serão discutidos pelos demais autores que participam deste livro. Com base no que acaba de se expor, o autor abordará, neste capítulo, um conteúdo pertinente à formação do ator, com fundamentação nos estudos fonéticos. Dará, pois, especial atenção a voz, a articulação, a ressonância e a profilaxia vocal, procurando  enfatizar a relevância deste estudo para o desenvolvimento de uma  técnica vocal do ator e para o aprimoramento científico (teórico e prático) do preparador vocal. Por este motivo,  colocará à disposição do leitor uma série de exercícios práticos, de fácil entendimento,  elaborados para o aprimoramento da voz artística.

Voz
    A voz é o instrumento do ator. O timbre vocal (sua qualidade natural) se enriquece com o aproveitamento de todo o seu potencial: ressonância, articulação, pronúncia e dinâmica vocal.O primeiro som que surge na glote[3] assemelha-se a um "cochicho", ganhando corpo sonoro à medida que alcança as cavidades de ressonância, que funcionam como verdadeiros amplificadores. Ocorre que, muitas vezes, estas cavidades são mal aproveitadas, tornando empobrecido o " timbre" vocal. A  articulação é importante para a produção da fala. A voz articulada produz sons lingüísticos, sílabas, palavras e sentenças que serão utilizados na elaboração e na transmissão do pensamento. A fala fica normalmente prejudicada quando a ponta, o dorso e a raíz da língua localizam-se em um ponto que não corresponde ao  som do fonema  desejado. O treinamento da voz falada tem como objetivo uma fácil compreensão e audição da mensagem oral pelo ouvinte. Por este motivo, a dicção deve ser clara e precisa, mas tendo o cuidado de não exagerar na articulação de vogais e de consoantes. Deve-se, sim, valorizar a expressividade do texto, apoiando-se na fluência do ar e em suas pausas. Uma pronúncia inadequada fere as normas da língua nacional. Pode, até mesmo, modificar o significado do vocábulo em um dado contexto. Dificulta, da mesma forma, a dicção, pois a palavra pode tornar-se obscura e incompreendida. Daí a preocupação com a articulação correta dos sons vocálicos e consonânticos, procurando observar as realizações fonéticas (o som) de acordo com as características regionais do falante ator e do personagem. A dinâmica vocal baseia-se na íntima relação que existe entre os dois meios de expressão do ser humano: o corpo e a voz. O desenvolvimento da acuidade auditiva, bem como das sensações corporais são imprescindíveis à formação de sua imagem vocal-corporal. O instrumento vocal precisa ser descoberto a partir do próprio corpo: a voz em resposta a uma atitude/movimento corporal, mas cuidando para que não haja esforço à fonação. A palavra transmite a existência de um objeto, de uma pessoa, de um sentimento. Mas é na linguagem vocal (voz) que a palavra encontra toda a riqueza de significados que varia de acordo com o momento e o contexto. Alterações na voz e/ou em todo o mecanismo (sistema efetor) responsável pela produção do som, interferirá negativamente na imagem vocal-corporal do indivíduo e em sua comunicação.

Ressonância
   A voz nasce na laringe, daí, irradiando-se para todas as regiões e espaços do corpo. A voz é enriquecida por cada uma destas partes, que vibra (reverbera) em contato com a onda sonora. Mas é necessário que o ator tenha consciência deste mecanismo vocal associado à prática (o fazer e o sentir). Este acoplamento deve ser conduzido de forma progressiva, a fim de não interferir na linguagem vocal e falada do ator. Sonorização (“humming”) de boca fechada, vocalizes e emissões em glissandos são exemplos de práticas utilizadas no aprimoramento vocal do ator. A busca de novos sons (pesquisa em voz), exigidas pela arte de representar, poderá ser facilitada pelo domínio (o fazer) destas diversas técnicas. A este respeito, faz-se a seguinte consideração: é correto sentir sensações vibratórias em toda a face e na boca, mas tendo o cuidado para não perder a naturalidade da expressão vocal. Ficar muito atento e concentrado para este tipo de sensação pode prejudicar a espontaneidade da voz. O resultado final da voz que ouvimos depende de todo um conjunto de sensações proveniente de um complexo sistema responsável pela fonação e pela comunicação. Nele, cada órgão, cada músculo possui uma função integrada dentro de um todo. Portanto, muito pouco contribuirá o trabalho de um único elemento isolado deste contexto. A ginástica vocal que o ator faz quando estuda canto corre o risco de se tornar uma prática meramente mecanicista. A técnica da voz cantada precisa ser fundamentada na fisiologia fonatória para não prejudicar a saúde vocal do ator. Este conhecimento técnico possibilita uma utilização mais consciente e mais eficaz do mecanismo fonatório. O estudo da voz cantada, quando bem conduzido, torna a voz potente e timbrada, a partir da utilização adequada das cavidades de ressonância, da fortificação muscular, do aumento e da dosagem do suporte respiratório e do desenvolvimento da extensão vocal. O fraseado na interpretação de obras musicais (teatro musical) é outro assunto que deve ser cuidado no transcurso das aulas de canto e voz. É a emissão das palavras (do continuum sonoro) com todos os sentidos presentes. Desta forma, torna-se necessário o entrelaçamento da voz com a palavra, isto é, a comunhão do que sentimos com o que pensamos. Enquanto a voz transmite o que sentimos (regula as emoções), a palavra transmite o que pensamos (desperta as emoções). O aperfeiçoamento vocal deve ser dividido em duas partes: uma preparação básica e outra, dedicada à imagem da palavra, aos sentidos e ao fraseado (voz falada e voz cantada). Na preparação básica, trabalhamos com o aprimoramento respiratório para uma fonação de longo alcance, para a liberação de todo e qualquer tipo de tensão que interfira na emissão, para a coordenação fono-respiratória (produção de sons vocálicos e consonânticos), para a articulação e para a pronúncia. A segunda etapa tem como objetivo trabalhar os sentidos dentro de uma visão espacial. As tonalidades vocais, por exemplo, são trabalhadas de acordo com as intenções desejadas, procurando sempre preencher os espaços indicados pelas palavras.As imagens e os sentidos, que despertam as palavras dentro de um fraseado devem ser amplamente trabalhados pelos professores de técnica vocal, pois são extremamente relevantes para a comunicação e para a criação artística. O falar torna-se mais presente, mais sentido e mais verdadeiro.O Fonoaudiólogo que atua na preparação vocal do ator deverá ser criterioso com relação à utilização de imagens no decorrer do treinamento vocal. A correta fisiologia da voz, que, em geral, é trabalhada quando ainda não há um amadurecimento vocal-corporal  justificando o seu emprego, não pode ser confundida com fantasias.
    A associação de imagens à fisiologia vocal comprova a real relação entre corpo e voz, devendo ela ser criada no sentido de beneficiar as modificações e os movimentos naturais das estruturas que compõem o mecanismo ressonador. Pensar que a voz “sai” dos joelhos, dos pés, do umbigo poderá ser muito positivo quando realmente ajuda o ator a modificar, isto é, a aproveitar ao máximo as partes móveis da principal região de ressonância da voz, o pavilhão laringofaringobuconasal. Portanto, a eficácia deste trabalho dependerá do desenvolvimento e do amadurecimento de uma imagem vocal-corporal-auditiva e do nível de sensações corporais por parte do ator. Enquanto isto não acontece, todo o trabalho deverá ser desenvolvido, explorando a expressividade do gesto e da fisionomia na expressão da voz (linguagem vocal) sem dar ênfase às fantasias e às imagens enganosas.Ressalta-se que a correta utilização da fisionomia e da voz é imprescindível à “formação teatral”: é a fase relativa à preparação básica da voz que todo ator deve ter e dominar. Servirá de base não só à preparação vocal no teatro, como também para ser utilizada na assistência vocal – na reposição, na restauração do mecanismo emissor – quando o ator perde a sua voz em cena.  Apresenta-se, a seguir, uma seleção de exercícios de sonorização e expressão vocal, desenvolvidos na disciplina Técnica e Expressão Vocal da Faculdade de Teatro da Universidade do Rio de Janeiro (UNI-RIO). Objetivam o aproveitamento máximo do mecanismo ressonador-articulador necessário à voz de longo alcance – laringe, faringe, rinofaringe, base do crânio, caixa craniana, boca e lábios – com a associação de movimentos corporais (fisionomia e gesto). Os exercícios pesquisados têm como fundamentação conteúdos de acústica : tom fundamental, harmônicos e espaço sonoro. São eles :
1.SONORIZAÇÃO DE BOCA FECHADA: SEM PROJEÇÃO LABIAL, o maxilar inferior está descontraído, as arcadas dentárias, levemente afastadas e a língua, relaxada no assoalho da boca com a ponta tocando suavemente os incisivos inferiores. Emite-se o som, sentindo a vibração penetrar através do osso palatal;

2.SONORIZAÇÃO DE BOCA FECHADA: realiza-se o MESMO PROCEDIMENTO ANTERIOR, alternando-o com projeção labial;

3.SONORIZAÇÃO DE BOCA FECHADA COM MOVIMENTO DE MASTIGAÇÃO: tem como finalidade espalhar o som nas cavidades supraglóticas, intensificando as sensações proprioceptivas decorrentes da vibração;

4.SONORIZAÇÃO INTERCALANDO OS MOVIMENTO DE BOCA FECHADA E ABERTA: o som emitido deverá ser praticamente o mesmo dos dois movimentos. Haverá um aumento da intensidade de emissão em decorrência da abertura articulatória;

5.SONORIZAÇÃO INTERCALANDO OS MOVIMENTO DE BOCA FECHADA E ABERTA: explora-se ao máximo a capacidade de movimentação da musculatura facial (alargar, alongar, estreitar). A língua deverá permanecer repousada no assoalho da boca com a ponta tocando suavemente os incisivos inferiores; maxilar inferior deverá estar descontraído;

6.SONORIZAÇÃO DE BOCA ABERTA COM MOVIMENTOS DIVERSIFICADOS DE LÍNGUA: este exercício possibilita uma variação na qualidade do som emitido à partir dos movimentos criados com a língua. Tem, também, por finalidade a liberação do músculo lingual em indivíduos que tensionam a base da língua com sensações de desconforto ou dor na região do osso hióide. Pode ser enriquecido com a incorporação dos seguintes movimentos:
6.1.Dobrando a ponta da língua para cima e para atrás dos dentes incisivos superiores e, em seguida, vibrando-a velozmente para fora e para dentro (com a  intercalação dos dois movimentos);
6.2. Esticando a língua com a ponta tocando a região alveolar superior e movimentando-a velozmente de um lado para o outro (entre os caninos e os primeiros pré-molares) com concomitante projeção labial;

7. SONORIZAÇÃO DE BOCA ABERTA CO-ARTICULADA COM A FORMA – EMBOCADURA – DAS VOGAIS: é imprescindível que a língua permaneça no chão da cavidade oral com a ponta exercendo uma leve pressão na região alveolar inferior. Os movimentos de alargar, alongar, elevar e abaixar as regiões da língua acontecerão de acordo com a vogal que está sendo emitida. Sente-se um direcionamento do som para as regiões do véu palatino e da rinofaringe. Este exercício possibilita uma conjugação de harmônicos nasais, favorecendo o enriquecimento sonoro e uma melhor projeção da voz no espaço. As etapas indicadas abaixo deverão ser seguidas:

7.1.Sonorização de boca aberta, explorando a capacidade de movimentação do mecanismo oro-facial;

7.2.Sonorização de boca aberta co-articulada com a forma das vogais (embocadura);

7.3.Sonorização de boca aberta co-articulada com a forma das vogais, passando gradativamente para a emissão plena da vogal ;

7.4.Sonorização de boca aberta co-articulada com a forma das vogais combinada com a  emissão plena da vogal , associada aos demais sons vocálicos.

8. EXERCÍCIO DA “FOCA”: é feito o direcionamento do som para a região da rinofaringe. Seu principal objetivo é o enriquecimento do tom fundamental de harmônicos nasais que, normalmente, não são utilizados em toda sua plenitude. Eles têm o poder de deixar a voz mais cristalina e mais encorpada, contribuindo para o crescimento de sua intensidade sem o mínimo de esforço, isto é, sem necessidade de aumentar o volume aéreo e tampouco o fechamento glótico.É um tipo de exercício que auxilia na eliminação de ruídos vocais, funcionando como um filtro sonoro, um “purificador” da voz. Os atores costumam relatar um maior conforto vocal em decorrência de uma sensação sonora mais agradável e mais eficiente no que diz respeito à projeção espacial.

[u]Articulação

   No trabalho com a articulação, devemos ter o cuidado para não exagerar (sobrearticular) na movimentação da boca; podemos ter como resultado uma contração indesejável de fibras musculares que normalmente não  tomam parte do ato articulatório. (O exagero pode ser utilizado como característica de um personagem, mas a sua realização deve ser consciente e dentro dos limites fonatórios aceitáveis). Ainda é comum observarmos a prática de exercícios que beneficiam mais os vícios vocais e as distorções fonéticas do que propriamente a clareza no dizer. Ler um texto com “pedrinhas” na boca ou com um lápis trincado entre os dentes são, ainda,. duas práticas oriundas da tradição e difundidas no meio teatral. Destas práticas, poderão surgir alterações fonéticas ou a acentuação de outras já existentes. Sigmatismo, posicionamento errado da língua no interior da cavidade bucal e tensões na musculatura facial são alguns exemplos clássicos (alterações) que poderão proceder destes exercícios rotineiros.O equilíbrio da motricidade oral é também fundamental para a boa fala. Uma má oclusão dentária, por exemplo, prejudica muito as articulações fonéticas, pois cria distorções, omissões e trocas de fonemas, além de favorecer a respiração bucal , um fator preponderante no desequilíbrio do mecanismo fono-articulatório. A respiração bucal também pode ser decorrente de quadros alérgicos crônicos (rinites, rinosinusites) ou simplesmente de um mau hábito respiratório (substitui-se a respiração nasal pela bucal).O ato de respirar  pela boca, propicia o surgimento de diversos quadros, como os enumerados a seguir:

-Favorecimento da respiração superior: a respiração pela boca beneficia o tipo respiratório superior, em decorrência do tempo de fonação normalmente reduzido nas pessoas que têm como hábito manter a boca aberta mesmo quando não estão falando. Elas armazenam pouco ar, além de provocarem tensão na região torácica, prejudicando a respiração, a fonação e a ressonância;

-Hipotonia da língua: o respirador bucal pode apresentar um desequilíbrio no tônus da musculatura orofacial e, principalmente, da musculatura lingual. Esta última, por sua vez, fica com sua mobilidade prejudicada, alterando sua capacidade de alongar, alargar, elevar, canelar e dobrar. É freqüente a presença de acúmulo de saliva pela dificuldade em deglutir (desequilíbrio miofuncional) em decorrência da diminuição da tonicidade muscular, além da alteração de fala pela dificuldade dos contatos da língua com os demais órgãos que participam da fonação. No caso específico do ator, esta alteração evidencia, muitas vezes, a aspersão de saliva sobre os demais atores que estão em cena;

-Palato em ogiva: é decorrente da quebra do equilíbrio de forças entre as cavidades oral e nasal. O indivíduo que tem o vício de ficar sempre de boca aberta acaba respirando mais pela boca do que pelo nariz. Isto faz com que o ar pressione o osso palatal no sentido vertical, dando origem a uma região “ côncava”, que denominamos de palato em ogiva (ou ogival). É um tipo de disfunção que pode trazer alterações de arcada, modificando a acústica dos fonemas vocálicos e a realização dos fonemas consonantais;

-Garganta ressecada: o ar que entra pela boca deixa de ser filtrado, umidecido e aquecido  (funções que são exercidas pelo nariz). É um ar frio, impuro, provocando não só o ressecamento do “fundo da garganta” (faringe), como também irritações e ardências. Resulta daí uma alteração na ressonância da voz, uma vez que a faringe é uma das principais regiões  para a amplificação de determinados harmônicos produzidos pelas vibrações glóticas. A “garganta” ressecada contribui para uma voz sem cor (perde muito de sua qualidade natural) e com prejuízo na projeção espacial;

-Disfunção estomatognática: o hábito de ficar de boca aberta, inspirando o ar necessário para vida e para a fonação implica, naturalmente, em uma perda de força (tônus) muscular. Os dentes ficarão sem o seu escudo natural (lábios cerrados, mandíbula relaxada, musculatura facial com tônus equilibrado) que, quando presente,  facilita o adequado funcionamento da arcada, da língua e da mandíbula. Como resultado, temos uma alteração estomatognática caracterizada por uma disfunção da mastigação, sucção e deglutição, alterando, por extensão, o sistema efetor da fala (respiração, fonação e articulação). Os movimentos respiratórios (inspiração e expiração) ficam prejudicados pelo ineficiente armazenamento aéreo e pela má utilização deste mesmo ar (movimento expiratório) durante a fonação. Deste modo, a renovação do ar é feita quase que ininterruptamente (num intervalo muito pequeno), diminuindo o tempo de fonação com interferência na eficácia da fala.

     Uma incompetência velofaríngea (“véu palatino preguiçoso”) pode acompanhar esse quadro; o véu palatino é um músculo importante para a ressonância da voz, pois de seu correto funcionamento realizamos sons orais (véu palatino elevado) e sons nasais (véu palatino abaixado).Assim, a junção do véu com a parede posterior da faringe impede a passagem do ar para a cavidade nasal, tendo como resultado a realização de sons oralizados. Quando não ocorre esta junção, uma parte do ar sonorizado dirige-se para a cavidade nasal, produzindo sons nasais. A incompetência velofaríngea altera, portanto, o correto funcionamento do esfíncter velar  descrito nas linhas anteriores, resultando em um quadro de contaminação nasal, com prejuízo não somente para a clareza da comunicação como para a projeção da voz no espaço cênico.  A alteração articulatória será proporcional ao grau de comprometimento das estruturas e do mecanismo respiratório exposto acima. Chiados e sibilos em excesso, alterações fonéticas, comprometimento da dicção e protrusão lingual, são alguns dos principais sintomas decorrentes das alterações estomatognáticas no que diz respeito à fala.Para a realização vocal correspondente às consoantes e às vogais, utilizam-se diversos órgãos articulatórios, constituídos, principalmente, pelos lábios, pela arcada dentária, pelo palato duro, pelo palato mole, pela úvula, pela língua (ponta, dorso e raiz) e pelo maxilar inferior (mandíbula). Estes órgãos articulatórios podem ser visualizados e sentidos (explorados) pelo falante. Alguns exemplos são expostos abaixo:

*É possível ver e sentir a movimentação do palato mole (véu palatino) com a realização intercalada dos sons [ a ] e [ ã  ]. Na realização do fonema vocálico [ a ], o véu palatino permanece elevado, não permitindo a passagem do ar para a cavidade nasal. Na realização do fonema nasal [ ã ], o véu palatino abaixa-se, permitindo que parte do ar  dirija-se à cavidade nasal;

*A língua é o principal órgão articulador. A maior parte dos sons lingüísticos é realizada pela articulação deste órgão em relação às partes fixas e às partes móveis existentes na boca e na faringe. Ela pode alargar-se, afinar-se, canelar-se, dobrar-se, lateralizar-se, elevar-se, abaixar-se, vibrar-se, projetar-se e retrair-se. A sua agilidade na realização destas ações favorece o trabalho articulatório, a realização dos sons lingüísticos, o aquecimento vocal e a boa fala.  Ela apresenta, por sua natureza anatômica, uma maior mobilidade na sua porção anterior em comparação com a posterior. Por este motivo, na Língua Portuguesa, há um maior número de fonemas produzidos nas regiões anterior e média da boca e um menor número, na região posterior ( véu, úvula e faringe);    

*As “bochechas” ou músculos bucinadores também apresentam grande capacidade de movimentação. Com a ajuda do ar ( com a manutenção de uma pressão intra-oral permanente), o ator pode movimentá-las de diversas formas: inflando-as, desinflando-as, movimentando-as para cima e para baixo, “estourando-as” com as mãos, entre outros movimentos. Esta exploração visa, sobretudo, o aquecimento muscular desta região, tendo como objetivo principal a facilitação do movimento articulatório para a criação de tipos vocais;

*Os lábios formam uma cavidade de grande valor para a formação de determinados sons lingüísticos e para a articulação. Dependendo de sua movimentação, do arredondamento ou do alargamento em combinação com os movimentos que ocorrem no interior da boca (cavidade oral), reconhecemos sons distintos em freqüência (altura tonal) e em ressonância (maior valorização de formantes[6] graves ou de formantes agudos).
 Os exemplos abaixo representam bem o que acabou-se de expor:

* [ i  ] – é um som vocálico realizado com a aproximação do pré-dorso da língua em direção ao pré-palato, concomitante a um alargamento das comissuras labiais. Forma-se, então, uma região estreita, por onde o ar sonorizado escapará, resultando na realização de um som que caracteriza a vogal  [ i ]. Por ser uma região estreita, há, como conseqüência, uma amplificação maior da freqüência aguda (harmônicos agudos) em relação à freqüência grave (harmônicos graves), pois quanto menor o volume constituído pela aproximação dos órgãos articulatórios, mais alta será a freqüência percebida da voz. Por esta razão, a vogal [ i ] é a mais aguda entre todas. Observa-se, ainda, uma elevação da laringe com diminuição do trato vocal, sendo assim, mais uma contribuição para uma maior valorização das freqüências agudas;

* [ e ] – é um som vocálico realizado com a elevação do pré-dorso da língua em relação ao pré-palato. Ocorre também um alargamento das comissuras labiais e um avanço anterior da língua. Quando comparada à vogal [ i ], podemos observar um avanço (no sentido horizontal) menor e um leve abaixamento do osso mandibular. O ator poderá experimentar estas realizações a partir de emissões intercaladas e consecutivas das vogais [ ie ie ie ie ....]. Durante esta prática, é preciso observar e sentir as movimentações articulatórias que ocorrem com a língua, com os lábios e com a mandíbula normalmente utilizadas para a distinção entre as duas vogais mencionadas;

* [ E  ] ( é ) – é um som realizado com movimentação semelhante aos sons vocálicos [ i ] e [ e ]. É um som mais aberto se comparado ao [ e ] e ao [ i ] e mais fechado em relação ao som de [ a ]. Isto quer dizer que, o grau de elevação da língua, é menor em relação as duas primeiras vogais mencionadas, assim como o avanço horizontal deste mesmo órgão ( língua ). As emissões intercaladas e consecutivas de [ ieé ieé ieé ieé... ], permitem vivenciar as movimentações  expostas para a realização destas três vogais. Apresenta, pois, o mesmo objetivo da prática proposta anteriormente; 

* [  ] ( ó ) – é um som vocálico realizado com a retração da língua em relação à parede posterior da faringe. De acordo com Matta Machado (1981), durante a realização deste som, a língua permanece praticamente no assoalho da boca[7], isto é, na mesma posição adotada para a realização do som vocálico [ a ]. Por esta razão, o critério adotado para diferenciar [  ] de [ a ], é o arredondamento labial. Aconselhamos, por este motivo, a valorização deste movimento articulatório durante a emissão do som vocálico [   ], para que assim o ator possa se beneficiar da  acústica peculiar a este som,  melhorando, conseqüentemente, a sua projeção no espaço global.

Profilaxia Vocal ( aplicada ao teatro )

    As alterações aludidas anteriormente são freqüentes nos profissionais da voz, sobretudo os atores. Isto deve-se principalmente ao ambiente (espaço físico) em que atuam. São locais impregnados de mofo e poeira, além de cortinas (da boca de cena, por exemplo), carpetes e piso de madeira nem sempre conservados. Encontramos ainda, como fatores agravantes, o fumo, o álcool e a bebida muito gelada, consumidos no decorrer dos ensaios ou mesmo em temporada. Por tudo isto, o ator precisa ser conscientizado da necessidade de adotar medidas profiláticas que possam preservar sua saúde vocal. Isto posto, discutiremos, a seguir, algumas destas medidas que julgamos importantes na higiene vocal do ator. Tomar água na temperatura ambiente nos intervalos dos ensaios ou apresentações teatrais é muito salutar, pois deixa uma sensação de frescor nos tecidos internos da “garganta”. É imprescindível manter as paredes internas da boca e da faringe lubrificadas para que não ocorra ressecamento, prejudicando o colorido da voz. Por outro lado, a água é um excelente expectorante, auxiliando na eliminação das impurezas (secreção, muco, toxinas) das vias aéreas superiores, normalmente encontradas em indivíduos alérgicos e fumantes. A higiene do nariz deve ser feita todos os dias com o intuito de manter livre a ventilação retro-nasal, contribuindo para uma respiração mais saudável e silenciosa. Aconselha-se, para este fim, lavar freqüentemente as narinas com soro fisiológico.Realizar inspirações e expirações, alternando as narinas ( narinas alternadas – yoga ) ou inspirar de forma lenta, suave, com as narinas abertas e em seguida suspirar estimulam a sensibilidade desta região para a troca gasosa, que mantém a vida, além de proporcionar um melhor armazenamento de ar necessário à fonação de longo alcance.
     O ato de bocejar é uma prática bastante eficiente para a voz do ator. O bocejo alarga as estruturas internas da boca e da “garganta”, além de elevar o teto posterior (véu palatino) da faringe. A língua deverá permanecer no assoalho da boca com a ponta tocando suavemente atrás dos dentes incisivos inferiores. A retração da língua (durante o movimento do bocejo) interfere no resultado final desta prática. Se o ator assim proceder, deixará de vivenciar uma sensação de abertura de uma das mais importantes regiões do mecanismo ressonador-articulador. A retração da língua ocupa uma parte da faringe, levando uma tensão ao osso hióide, que apóia a raiz da língua, desencadeando freqüentemente uma sensação de desconforto, de dor, na base deste músculo no uso profissional da voz artística. O aquecimento vocal deve ser realizado com sons vibrantes, vogais e sonorizações (“humming”). O alofone [  ] constritivo vibrante múltiplo ápicoalveolar sonoro[8] é um excelente exercício de aquecimento e limpeza das pregas vocais. A correta emissão deste som, estimula a movimentação (vibração) da mucosa, que reveste os músculos vocais. As vogais desempenham uma função importante no mecanismo ressonador-articulador. São realizadas sem obstáculos à livre passagem do ar e, portanto, são consideradas sons “puros”. A capacidade de movimentação da língua é fundamental para uma boa produção do fonema correspondente à vogal: é preciso que ela esteja solta e livre de toda e qualquer tensão. Ressaltamos que a ponta da língua deverá permanecer atrás dos dentes inferiores, mesmo quando for preciso elevá-la, estreitá-la ou alargá-la durante a realização dos sons vocálicos. Esta postura é necessária para evitar a retração da língua que, como foi visto anteriormente, ocupa espaço da faringe, prejudicando a ressonância dos sons vocálicos e dos sons consonantais.

Enumeramos, abaixo, oito exercícios que podem ser utilizados para estimular a movimentação e a postura correta da língua.

1. Coloca-se a ponta da língua para fora e em seguida deve-se recolhê-la para dentro da boca (três vezes) e retorná-la à posição de repouso;

2. Coloca-se a ponta da língua para fora e para cima, tocando o lábio superior, novamente esticando-a e, em seguida, recolhendo-a para dentro da boca (três vezes);

3. Passa-se a língua pelos lábios superior e inferior, três vezes para um lado e, depois, três vezes para o outro, esticando-a e recolhendo-a para dentro da boca;  

4. Estala-se a língua, realizando movimentos intercalados de alargamento e protrusão labial, de acordo com a forma bucal utilizada na emissão dos sons vocálicos [ a ] e [  ][9] (três vezes);

5. Estala-se rapidamente a ponta da língua atrás dos dentes incisivos superiores e inferiores (diversas vezes);

6.  Leva-se rapidamente a ponta da língua de uma comissura labial à outra (diversas vezes);

7. Dobra-se a ponta da língua para cima e para trás dos dentes incisivos superiores e, em seguida, deve-se vibrá-la velozmente para fora e para dentro (diversas vezes);

8.  Junta-se a saliva, inspira-se suavemente pelo nariz, deglute-se na pausa inspiratória com a ponta da língua presa à região palatal (o céu da boca) e, em seguida, boceja-se e/ou suspira-se.  

A leitura em voz alta e numa intensidade adequada (evitando o esforço vocal e o grito) deveria ser um hábito diário do ator. Ela possibilita a utilização e o desenvolvimento das técnicas aprendidas, contribuindo para o amadurecimento de seus atributos vocais. A variação da tonalidade vocal, do colorido da voz, da articulação, da pronúncia, do ritmo e da velocidade dos vocábulos emitidos, são alguns dos elementos da dinâmica vocal mais beneficiados com a prática diária da leitura.

Considerações Finais
O ator que está em exercício de ensaio constante deverá sempre zelar por sua voz, sobretudo, se usa tons agudos e grande intensidade vocal.É muito salutar o hábito de exercitar a voz (aquecê-la) antes de um ensaio ou de uma performance teatral,  principalmente pela manhã, quando a voz se encontra mais agravada e desaquecida.As sonorizações, quando bem realizadas, canalizam a energia sonora para as cavidades oral e nasal, espalhando-a pelo trato vocal. Conseqüentemente, a ressonância ascende à região superior, diminuindo muito a tensão laríngea. A correta sonorização também promove um alargamento do “fundo da garganta”, protegendo-a de mecanismos geradores de tensão.Sua produção de lábios cerrados faz com que ocorra uma maior concentração de energia sonora na cavidade nasal, além de promover um retorno de parte do som para a região glótica, provocando um mecanismo de “impedância refletida” que suavizará a tensão laríngea. A manutenção do som com os lábios cerrados acoplada à técnica mastigatória torna ainda mais vigorosas as sensações vibratórias na máscara facial.Por isso, as vogais, quando precedidas das sonorizações, têm uma projeção mais eficiente, ou seja, são lançadas no espaço após a distribuição da energia sonora por toda a face. São exercícios valiosos para a colocação das mesmas, pois evitam que sejam produzidas guturalmente.Sugerimos que as práticas discorridas anteriormente sejam realizadas de “olhos abertos” e com consciência espacial. É preciso dirigir a produção sonora para um determinado foco (centro) do espaço, evitando, desta forma, invasões espaciais desnecessárias que sempre acabam em abusos vocais. Imaginar um objeto, uma pessoa disposta em um determinado ponto facilita a concentração e a direção da emissão. Uma vez imbuídos da boa técnica, nada impede a utilização de imagens em favor da relação CORPO-VOZ-ENCENAÇÃO.Pode acontecer uma sensação rápida de “fadiga vocal” ao final de uma bateria de exercícios de voz. Porém, a persistência da fadiga é muito prejudicial, indicando o uso de uma técnica vocal imprópria para a voz profissional. Caso não seja corrigida a tempo, ela pode desencadear alterações de massa (lesões secundárias) nas pregas vocais por mau uso da voz (impacto vocal).Finalizando, procuramos mostrar a importância da técnica vocal para o ator, colocando em evidência a necessidade de conhecimentos concernentes à voz artística que deve ter o profissional que atua no aprimoramento e no desenvolvimento da voz teatral.

FONTE:profala.com

Atenciosamente.
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